sábado, 28 de julho de 2012

(re)lembranças: Ocupação Dandara, a Praça da Estação e a ocupação da Cidade.




Domingo, dia 06 de novembro de 2011. Saio de casa (como sempre) correndo temendo não chegar a tempo a  famigerada prova do ENADE. Eu faria aquela prova na Escola Estadual Três Poderes, na região da Pampulha, e eu já havia realizado o itinerário em minha cabeça e chegaria com tempo sobrando na Escola, tempo para conversar com alguns amigos que eu não encontrava a algum tempo e também já tinha em mente que depois da prova, deslocaria para a comunidade Dandara, que fica relativamente próxima a Escola, mas isso explico depois... Contudo, ao chegar à Estação Central - Praça da Estação - em BH, percebi que estava perdido... Um trânsito louco, seguranças mais perdidos do que eu que não sabiam informar onde tomar um ônibus... Havia nesse espaço (praça da estação e Avenida dos Andradas) uma grande estrutura montada. Aconteceria ali o show do grande cantor Andrea Bocelli e a praça estava totalmente cercada por muros de ferro em torno da Praça da Estação e parte da Avenida dos Andradas  e catracas em alguns pontos estratégicos que dariam acesso ao local do show... Por isso, uma saída rápida para tomar um ônibus na praça foi impossível. Nesse momento comecei a pensar: Ora, um espaço público, com catracas e muros? O controle pela catraca serve para limitar quem pode ocupar o espaço da praça, obedecendo (obviamente) os rituais da gestão de Márcio Lacerda (vide a violência usada pela prefeitura para a desocupação da comunidade Eliana Silva, as restrições em relação à ocupação da praça da estação, ou os atos da prefeitura em relação aos artesãos que ocupam a praça 7 em BH). Além disso, para assistir ao show as pessoas deveriam ter ingressos que seriam distribuídos pelos patrocinadores do evento. Aliás, nada contra o cantor em questão, ou as pessoas que foram ao show... Não é preciso lembrar que essa região da cidade possui como grande "problema" os moradores de rua. Nada mais "legítimo" (sob o olhar de quem  "governa" a cidade, é óbvio) do que afastar os “seres indesejáveis" desses espaços. Eis a privatização de um importante espaço de sociabilidade da cidade de Belo Horizonte!


Mas voltando a minha saga...

Ao fim da belíssima prova (que serviu também para comprovar como possuímos bons professores de educação física, e outros que não merecem lembrete nenhum...) estava me organizando para ir para a comunidade Dandara localizada no bairro Céu Azul. Lá aconteceria vários shows (O evento que contou com o show do MC Dedé, Julgamento, Graveola e o Lixo Polifônico e fechando a belíssima noite, a banda de ska Pequena Morte) em solidariedade a grande ocupação que ainda sofre com os desmandos dos "poderosos" do Estado de Minas Gerais (para conhecer o histórico da comunidade e também as suas ações, dá uma olhadinha aqui).

Chegando lá, deparo-me com um cenário bem diferente daquele da praça da estação. Os moradores da ocupação eram os atores envolvidos com a realização do evento: vendendo lanches e bebidas, participando da segurança do evento.

Mas, ora bolas, durante o evento a polícia militar se fez presente (e principalmente durante o show do julgamento, rap de primeira linha...) e em alguns momentos no meio das pessoas! E eu com minha doce inocência, "fiquei feliz", pensei: "legal, eles estão aqui para celebrar!" Mas, engraçado, eles eram muitos!? Assim como no show do Emicida no Barreiro, em que a polícia sempre dá o ar da sua graça. Por sinal, show em que o rapper foi preso pela polícia sob a alegação de “incitar o desacato à autoridade” ao cantar a música "dedo na Ferida". Não vou entrar novamente no mérito desse tema, mas vocês podem ler algo interessante sobre esse episódio na revista fórum, mas ressalto a presença da polícia principalmente em eventos localizados na periferia da cidade (esse tema precisa de maior aprofundamento certo?). Bom, independente dos poréns, foi bacana ver alguns encontros, não vou arriscar uma descrição, deixo um breve vídeo e alguns registros feitos por mim em uma tarde regada a musica, pintura na molecada e um futebol que tinha como limite toda a comunidade Dandara!

Vídeo do sitio I love bubble...














Um recorte do evento na comunidade Dandara...













A frase do dia: "Nem só de polícia vive a paz social..."















Um recorte mal feito (o fotografo não ajuda mesmo!) do belo painel feito pela galera.







Não sei se a foto ajuda, mas o menino segura uma bola... Esse foi o momento do futebol!








Obviamente, existem alguns pontos... Talvez seja possível encontrar pessoas que não tenham relação nenhuma com a luta da Comunidade Dandara e que a sua presença nos shows esteja ligada “meramente” com a música (apesar de perceber complicações nisso, pois não é possível analisar a música como algo isolado da sociedade que a constrói), mas ressalto o envolvimento das pessoas envolvidas com o evento...

Mas, para esse texto ter algum sentido (algumas pessoas precisam disso neh?), remeto-me ao principio desse. É incrível (de alguma forma importante e alentador) ver duas "cidades" dentro de uma só. Em "uma" notei o cerceamento da ocupação pelos moradores, da violência realizada contra àqueles que resistem a essa intervenção (seja por parte da prefeitura, governo do Estado, ou outras instituições), e em outra notei outra possibilidade em se constituir como cidadão, com todos os limites e possibilidades enfrentados pelos moradores de tantas ocupações pelo país e pelo mundo.

Eu penso que esse texto torto está um pouco atrasado, mas como aprendi com Hannah Arendt, ainda vivemos em tempos sombrios, em que confundimos algumas coisas... Nesse ponto, acho que essas linhas extremamente tortas ainda fazem algum sentido para esse sensível "pensador".


PS: Narrei aqui um pouco da experiencia dos moradores da Ocupação Dandara, mas vale lembrar que outras tantas existem em Minas e no País. Citei rapidamente o caso da Ocupação Eliana Silva, Mas outras tantas existem e sofrem os mesmos problemas...

PS2: Não preciso lembrar do absurdo na desocupação da comunidade Eliana Silva, havendo violência ou não (Para não legitimarmos as desocupações "negociadas" que tiram as famílias de espaços próximos ao centro para jogar todos eles para bairro extremamente longe de seus trabalhos e escolas por exemplo) estamos falando de um direito universal... Acesso à moradia como condição primordial para a sobrevivência, simples assim.