Domingo, dia 06 de novembro de 2011. Saio de casa (como
sempre) correndo temendo não chegar a tempo a
famigerada prova do ENADE. Eu faria aquela prova na Escola Estadual Três
Poderes, na região da Pampulha, e eu já havia realizado o itinerário em minha
cabeça e chegaria com tempo sobrando na Escola, tempo para conversar com alguns
amigos que eu não encontrava a algum tempo e também já tinha em mente que
depois da prova, deslocaria para a comunidade Dandara, que fica relativamente próxima
a Escola, mas isso explico depois... Contudo, ao chegar à Estação Central -
Praça da Estação - em BH, percebi que estava perdido... Um trânsito louco,
seguranças mais perdidos do que eu que não sabiam informar onde tomar um
ônibus... Havia nesse espaço (praça da estação e Avenida dos Andradas) uma
grande estrutura montada. Aconteceria ali o show do grande cantor Andrea
Bocelli e a praça estava totalmente cercada por muros de ferro em torno da Praça
da Estação e parte da Avenida dos Andradas e catracas em alguns pontos estratégicos que
dariam acesso ao local do show... Por isso, uma saída rápida para tomar um
ônibus na praça foi impossível. Nesse momento comecei a pensar: Ora, um espaço
público, com catracas e muros? O controle pela catraca serve para limitar quem
pode ocupar o espaço da praça, obedecendo (obviamente) os rituais da gestão de
Márcio Lacerda (vide a violência usada pela prefeitura para a desocupação da
comunidade Eliana Silva, as restrições em relação à ocupação da praça da estação, ou os
atos da prefeitura em relação aos artesãos que ocupam a praça 7 em BH). Além disso, para assistir ao
show as pessoas deveriam ter ingressos que seriam distribuídos pelos
patrocinadores do evento. Aliás, nada contra o cantor em questão, ou as pessoas
que foram ao show... Não é preciso lembrar que essa região da cidade possui
como grande "problema" os moradores de rua. Nada mais
"legítimo" (sob o olhar de quem "governa" a cidade, é óbvio) do que afastar os “seres indesejáveis"
desses espaços. Eis a privatização de um importante espaço de sociabilidade da
cidade de Belo Horizonte!
Mas voltando a minha saga...
Ao fim da belíssima prova (que serviu também para comprovar
como possuímos bons professores de educação física, e outros que não merecem
lembrete nenhum...) estava me organizando para ir para a comunidade Dandara
localizada no bairro Céu Azul. Lá aconteceria vários shows (O evento que contou
com o show do MC Dedé, Julgamento, Graveola e o Lixo Polifônico e fechando a
belíssima noite, a banda de ska Pequena Morte) em solidariedade a grande
ocupação que ainda sofre com os desmandos dos "poderosos" do Estado
de Minas Gerais (para conhecer o histórico da comunidade e também as suas ações, dá uma olhadinha aqui).
Chegando lá, deparo-me com um cenário bem diferente daquele
da praça da estação. Os moradores da ocupação eram os atores envolvidos com a
realização do evento: vendendo lanches e bebidas, participando da segurança do
evento.
Mas, ora bolas, durante o evento a polícia militar se fez
presente (e principalmente durante o show do julgamento, rap de primeira
linha...) e em alguns momentos no meio das pessoas! E eu com minha doce inocência, "fiquei feliz", pensei: "legal, eles estão aqui para celebrar!" Mas, engraçado, eles eram muitos!? Assim como no show
do Emicida no Barreiro, em que a polícia sempre dá o ar da sua graça. Por
sinal, show em que o rapper foi preso pela polícia sob a alegação de “incitar o
desacato à autoridade” ao cantar a música "dedo na Ferida". Não vou entrar novamente no mérito desse tema, mas
vocês podem ler algo interessante sobre esse episódio na revista fórum, mas
ressalto a presença da polícia principalmente em eventos localizados na
periferia da cidade (esse tema precisa de maior aprofundamento certo?). Bom,
independente dos poréns, foi bacana ver alguns encontros, não vou arriscar uma
descrição, deixo um breve vídeo e alguns registros feitos por mim em uma tarde
regada a musica, pintura na molecada e um futebol que tinha como limite toda a
comunidade Dandara!
Vídeo do sitio I love bubble...
Um recorte do evento na comunidade Dandara...
A frase do dia: "Nem só de polícia vive a paz social..."
Um recorte mal feito (o fotografo não ajuda mesmo!) do belo
painel feito pela galera.
Não sei se a foto ajuda, mas o menino segura uma bola...
Esse foi o momento do futebol!
Obviamente, existem alguns pontos... Talvez seja possível
encontrar pessoas que não tenham relação nenhuma com a luta da Comunidade
Dandara e que a sua presença nos shows esteja ligada “meramente” com a música (apesar de
perceber complicações nisso, pois não é possível analisar a música como algo isolado
da sociedade que a constrói), mas ressalto o envolvimento das pessoas
envolvidas com o evento...
Mas, para esse texto ter algum sentido (algumas pessoas precisam disso neh?), remeto-me ao
principio desse. É incrível (de alguma forma importante e alentador) ver duas
"cidades" dentro de uma só. Em "uma" notei o cerceamento da
ocupação pelos moradores, da violência realizada contra àqueles que resistem a
essa intervenção (seja por parte da prefeitura, governo do Estado, ou outras instituições), e em
outra notei outra possibilidade em se constituir como cidadão, com todos os
limites e possibilidades enfrentados pelos moradores de tantas ocupações pelo
país e pelo mundo.
Eu penso que esse texto torto está um pouco atrasado, mas
como aprendi com Hannah Arendt, ainda vivemos em tempos sombrios, em que
confundimos algumas coisas... Nesse ponto, acho que essas linhas extremamente
tortas ainda fazem algum sentido para esse sensível "pensador".
PS: Narrei aqui um pouco da experiencia dos moradores da Ocupação Dandara, mas vale lembrar que outras tantas existem em Minas e no País. Citei rapidamente o caso da Ocupação Eliana Silva, Mas outras tantas existem e sofrem os mesmos problemas...
PS2: Não preciso lembrar do absurdo na desocupação da comunidade Eliana Silva, havendo violência ou não (Para não legitimarmos as desocupações "negociadas" que tiram as famílias de espaços próximos ao centro para jogar todos eles para bairro extremamente longe de seus trabalhos e escolas por exemplo) estamos falando de um direito universal... Acesso à moradia como condição primordial para a sobrevivência, simples assim.