quarta-feira, 31 de dezembro de 2008

Sobre Israel e o "novo" ataque à Faixa de Gaza

Como não poderia deixar de ser, gostaria de iniciar essa reflexão com uma frase "A exigência que Auschwitz não se repita é a primeira de todas para a Educação." Theodor Adorno... A mesma frase? perguntam alguns, sim! A mesma frase. Por que? Auschwitz, significa violência desmedida (como se houvesse violência na medida certa...), arbitrariedade politica e "etcetera e tal..." Contudo uma pergunta deve ser feita? Recorrendo ao presidente do Irã, onde está a ONU? Essa instituição nasceu com o interesse de mediar conflitos? Sim. Maaaaaasssss recorrendo novamente a Marx existe uma distancia muito grande entre aparência e essência... Por que? Todos sabem que o Estado de Israel sempre foi aliado aos interesses do imperialismo estadunidense. Enquanto os EUA ditarem as regras nesse planetinha as coisas funcionarão dessa forma... O mais irônico é ver uma nação formada em sua maioria por judeus saindo do posto de oprimido para o papel de opressor...


Na verdade, não vejo nenhuma novidade nessa ação de Israel... isso sempre aconteceu porem, os defensores do estado Israelense (preocupados com o interesse do capital...) escondiam isso...


O problema é que não estamos aprendendo com os erros do passado...

Reflexões devem ser feitas pelos "chefes" de estado...

segunda-feira, 29 de dezembro de 2008

Ultimos dias de ano e vale a pena postar textos legais... mais um indicado por Alexandre Vaz, dessa vez fazendo uma interessante reflexão sobre o esporte... Boa leitura pra quem anda frequentando esse espaço!! Abraços!!!


Ps: Fonte - Diário Catarinense


Esporte, identidades e os limites do corpo

Ao encerrar a carreira, o tenista Gustavo Kuerten queixou-se de que o instrumento pelo qual se fez campeão tenha sido o seu próprio algoz

Gustavo Kuerten abandonou a carreira de jogador profissional de tênis na última edição do Torneio de Roland Garros, o mesmo torneio que o consagrara em 1997. É muito provável que o adeus de Guga seja definitivo, contrariando vários casos de ídolos nacionais e estrangeiros que protagonizaram diversas "despedidas", fosse porque se engajaram em novos projetos profissionais, como Pelé - que, em 1975, foi jogar no New York Cosmos depois que abandonara o futebol no ano anterior - , ou porque não suportaram o desprazer de não seguir competindo, mesmo com performances aquém das que alcançaram em seus anos de glória, como Michael Jordan. É difícil que Guga volte às quadras porque seu desempenho nos últimos anos já vinha sendo bastante insatisfatório em função de uma lesão no quadril que lhe limitara os movimentos e causava dores insuportáveis, mesmo para um atleta de altíssimo rendimento, como foi seu caso. O ídolo tentou, mas, como várias vezes foi repetido ao longo das últimas semanas da carreira, foi derrotado pela dor.

Naquele mesmo ano de 1997, vivendo em país estrangeiro, surpreendi-me enormemente quando li e ouvi sobre a sensação do Aberto da França: um brasileiro, com sobrenome e passaporte germânicos, como destacavam os jornais alemães, avançava de forma convincente no principal torneio anual de tênis disputado em piso de saibro. Fiquei, como quase todos, impressionadíssimo e contente com a performance de Guga, que, batendo um a um, tenistas experientes e renomados, alcançou a vitória final numa tarde de maio, um domingo.

Não foi a única vitória de Guga, nem na França nem no nobre saibro. Aquele primeiro grande triunfo se estendeu nos anos seguintes, "trazendo de volta", como tantas vezes se leu e ouviu, a alegria das manhãs de domingo, momento em que geralmente aconteciam as tantas finais vencidas pelo catarinense, campeão freqüente em fuso horário algumas horas à nossa frente. Essa "volta" remetia a outro ídolo esportivo nacional, Ayrton Senna, vencedor de corridas de Fórmula-1, freqüentemente também por volta do horário do almoço dominical. "Guga é Senna" chegou a dizer a economista Elena Landau, e o próprio tenista não escapou de se referir ao ídolo que o antecedeu, consagrado campeão de um esporte que os brasileiros aprenderam a apreciar. País de tantas desigualdades, talvez não seja tão surpreendente o fascínio pelo nosso maior tenista, nem pelas máquinas de correr que reluzem em velocidade espantosa. É possível que tanto o tênis quanto as corridas de automóveis sejam esportes mais interessantes quando mediados pelas câmeras televisivas do que ao vivo, exceção feita ao fã ardoroso ou à experiência eventual de tomar parte do circo por completo, comparecendo às arquibancadas para, de perto, deixar-se mergulhar no banquete sensorial dos grandes eventos esportivos. Nossa sensibilidade, afinal, está muito mais acostumada à transmissão televisiva dos esportes, em especial do futebol, do que à presença ao vivo nos estádios. O espetáculo esportivo, pelo menos desde Leni Riefensahl, é produzido para ser televisionado, construído para ser captado na organização onírica das imagens a que assistimos em nossas casas. Guga e suas roupas coloridas, cabelos compridos, gestos largos e inusitados na quadra, arroubos de alegria e eventuais destemperos, não é uma exceção entre os especulares atletas que, além de competirem contra seus adversários, atuam, como anteviu Walter Benjamin, para a câmera.

É a força das imagens que constrói, em grande medida, as identidades que agenciamos e por meio das quais nos reconhecemos comunitariamente. Da infinita disputa pela imagem de Guga e na correspondente tentativa de agenciá-la em favor desta ou daquela leitura de o que seria nossa identidade (a insistente pergunta pelo que somos), não escapou um de nossos melhores intérpretes, o antropólogo Roberto DaMatta. "Malandro", como teria sido Senna, temperamental, apegado à família, eis o Guga brasileiro de DaMatta. Retomando Gilberto Freyre, DaMatta viu no desempenho de Guga a globalização, que faz espelhar, localmente, cada brasileiro: nosso melhor tenista respeitaria, ao cultivar um "penteado afro", o "mito das três raças".

O requerimento da imagem de Guga nas disputas pelas identidades não impediu que ele fosse visto como um "manezinho da Ilha", figura local que "colocou Florianópolis no mapa", torcedor do Avaí Futebol Clube (os jornais alemães já destacavam o fato como pitoresco, em 1997), alguém que poderia ser encontrado nas praias de Florianópolis, praticando surfe ou apenas se divertindo com os amigos. Descendente de alemães, "manezinho da Ilha", treinado por um profissional oriundo do Rio Grande do Sul, expressão do mito das três raças, pivô de uma crise entre o Comitê Olímpico Brasileiro e uma marca de produtos esportivos que o patrocinava, fato que por pouco não lhe deixou fora dos Jogos de Sydney 2000: parece que nada se deixa escapar, em tempos de atletas espetaculares e de narrativas heróicas sobre eles, da imagem de Gustavo Kuerten. Um pouco de nossos sonhos e projeções, o que gostaríamos de ser, um guerreiro que sozinho enfrentou todos os grandes tenistas de seu tempo. E os derrotou. Na falta de projetos coletivos e de utopias, fiquemos com a figura que simboliza a pureza do corpo forte, indivisível, completo, vencedor. Certamente não é apenas isso que nos fascina no esporte em geral e em Guga em particular, mas ele, vitorioso por nós, nos alivia de nossos fracassos e, principalmente, do gosto amargo de nossa falta de futuro.

Mas o fato é que Guga também decaiu, encerrando sua carreira de enorme sucesso em posição mais que discreta no ranking mundial, um lugar que quase contrasta com o caráter de espetáculo que sua turnê de despedida ganhou. Claro que entrou em jogo o reconhecimento por sua trajetória, e por isso pouco ou nada se ouviu de críticas ao tenista, muito mais se escutou, aqui e ali, lamentos que apenas sucederam os meses de solidariedade pelo anunciado esforço de recuperação física. Como outros atletas de sucesso, Guga reclamou pouco do destino que lhe impingiu tantas dores corporais. Disse, no entanto, que se o corpo permitisse, poderia seguir jogando bem por mais alguns anos, lamentando que o instrumento por meio do qual se fez campeão lhe tenha pregado essa peça. Já em seus tempos de glória, em mais de um torneio se viu, e em pelo menos uma vez seu treinador declarou, em alto e bom som, que a dor e o sofrimento faziam parte do cotidiano de Guga, tributo a ser pago pelos troféus, pela fama. Nenhum adversário, mas seu próprio corpo doloroso foi-lhe o algoz final.

Ao dizer que a dor lhe tirou a possibilidade de seguir jogando em alto nível, Gustavo Kuerten mostrou uma face pouco lembrada da competição esportiva, esta forma tão contemporânea de celebrar a crença na linearidade do progresso sem considerar suas contradições. No esporte, trata-se de aprimorar o corpo em sentido muito específico, tomando-o, de certa forma, como algo a ser dominado, vencido. O corpo é o instrumento do sucesso, mas também o seu limite. Theodor W. Adorno disse, certa vez, que há no esporte um impulso à crueldade e ao masoquismo. Mirando os atletas, é de se perguntar em que plano se coloca uma ética em relação ao corpo e à vida nesses tempos de corpos que apenas parecem ser ilimitados. É possível que encontremos uma resposta não nas grandes narrativas de feitos heróicos no esporte, como os de Guga, mas ao pensarmos sobre a fascinação que eles nos trazem ao olvidarmos (e celebrarmos) da dor que lhes é inerente. Afinal, seria bom que não nos esquecêssemos daquilo que um "maldito" filósofo uma vez ensinou: que, por sorte, há limites no corpo, e eles nos fazem sempre recordar que não podemos ser Deus.

* Professor do Centro de Ciências da Educação da UFSC

ALEXANDRE FERNANDEZ VAZ *